domingo, 21 de fevereiro de 2010

Domingo


Ele estava “endomingado”, diriam uns. Era uma roupa diferente daquela que usava durante a semana. O dia estava claro, mas não fazia muito calor. Caminhava entre os arbustos que ladeavam a escada da igreja. Ninguém parecia notá-lo, aquele mundinho, tão pequeno, parecia ser todo seu. Olhava os insetos que subiam pelas plantas, pegava alguns pelas asas, jogava outros para o alto para ver se voariam...


Subitamente, um som rasgou o barulho da multidão. Ouviu seu nome e uma recomendação: “meu filho, não faça isso, você vai sujar sua roupa, venha para cá!”. Mesmo assim, nenhum olhar alheio o notou. Sua mãe, ao perceber que atitude da criança não havia mudado, esqueceu-se dela. Ali estava ele, em seu mundo, vivenciando cada instante de um breve momento de pura felicidade, sorrindo para as coisas mais minúsculas e insignificantes.


Quem poderia julgar que o menino sabia que era domingo? Mas, talvez, fosse possível imaginar que ele sabia que o domingo era todo dele... Isso se alguém considerasse sua existência.
Enquanto se divertia, os sinos badalaram. Todos deveriam entrar. As brincadeiras deveriam parar, as crianças sossegar, o ar se entristecer. Ali, naquele lugar, por rápidos segundos, o contraste se fez: o menino, solitário, com um rosto alegre, exultante, e os adultos, juntos, compungidos, contristados, pálidos...


Em meio à plena descontração, sentiu um forte solavanco. Sua mãe o puxou pelo braço, com a feição de raiva. “Por que ele não a ouvia?” Deve ter se perguntado aquela senhora. Assim, a solavancos, entraram ambos pelos portais da igreja. Ele, choroso, porém, irreverentemente, sentou-se em um banco. Olhava de um lado para o outro, como se estivesse enfastiado com cada segundo que se estendia, teimando para se tornar interminável.


As canções foram cantadas, as palavras ditas, os olhos fechados... Nada disso parecia importar. Quando tudo parecia perdido, ele olhou para os nós da madeira dos bancos e começou a alisá-los com os dedos. Dava a impressão de que eles eram caminhos, desenhos, lagos, tudo, menos partes de um banco. Sua face se tornou novamente tranqüila, serena, alegre. Entre as pessoas, nada mudou. Todos continuavam sérios, atenciosos, distantes...


Foi assim, passando as mãos entre os nós, fazendo voltas com os dedos, que pela primeira vez outra senhora o notou. Quem a viu não entendeu, mas ela sorriu também. Não, eu não a conhecia. Isso não importa, nunca vou esquecê-la. No entanto, não compartilhei com eles aquela felicidade mútua, aquela alegria de domingo...


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