sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

A prece...


Ali estava ela, de joelhos... Silenciosa por fora, plena de murmúrios por dentro. Percebia-se isso pelo retesamento do rosto, pelo movimento dos lábios, pelos olhos fechados... Quem a olhava via alguém no mais profundo de si, visitando as entranhas do próprio ser. Uma alma que transcendia aquele espaço.

O tempo parava em torno dela. Todos os objetos em torno pareciam ter se tornado grandes ouvidos. Tudo a contemplava fixamente. Nada, absolutamente nada, ousava falar. Dos sinos, só se ouvia o ressoar das últimas badaladas... Calmamente... Sonoricamente... Decaindo.

Nada era vivo... Nada era fúnebre.

Os outros que entravam no templo, ao olharem aquela figura ajoelhada ao centro, também se calavam, caminhando levemente. Alguns queriam fechar os olhos, mas não conseguiam. Estavam unidos aos objetos. Tornaram-se somente ouvidos... Espírito e divagação.

Pelas janelas, uma fresca brisa penetrou, balançando as folhagens nos vasos, os fil ós, as guirlandas... Foi lentamente até tocar os cabelos dela, os quais se entregaram a um breve movimento. De pronto, uma lágrima, apenas uma, correu dos olhos dela. Nesse instante, o silêncio foi quebrado por um suspiro...

Um rápido suspiro e... Seu rosto estava como antes, numa contrição comovente. Era todo angélico... Só isso bastaria para torná-lo belo.

Todo temor do mundo estava presente. Todo tremor se fazia sentir...

A aura estava intacta, enquanto as cores do céu dançavam ufanosamente, sempre se transformando. Alegria celeste, tristeza bela... Sofrimento gostoso que se continha... Infindável.

Um vazio nostálgico tomou conta da atmosfera. Foi quando os sinos badalaram. Eram seis da tarde. Uma, duas, três... Seis badaladas. Seu tom era solene, como o resto do universo. Era sublime.

A igrejinha ficava no alto daquele morro, destacada pela paisagem. Era reverenciada pelas velhas casinhas.

Era a hora em que suas luzes se acendiam, todas num amarelo profundo. Elas diziam: aqui tem gente assim, com vontade de chorar também. A pequena vila esperava... Tudo esperava que ela saísse por aqueles portais. Todos se preparavam para o cortejo.

Lá dentro, os olhos dela se abriram, levantando-se sem que mirassem um ponto fixo. Sequer olhavam o horizonte. Em sincronia, ela também se levantou. As luzes do templo ainda estavam apagadas. Só as velas iluminavam seu caminho. Era tudo muito pequeno, tudo tão imensamente completo... Era só o infinito.

Andou até o portal e saiu... Desceu a ladeira enquanto todos a observavam pelas janelas. Aos poucos, sua silhueta foi se confundindo com a escuridão noturna. Diante da pálida e plácida admiração alheia, desapareceu... O calor daquela noite era confortável. Foi quando minha mãe me disse: terminou meu bem, agora sim terminou...


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